Imagine ir ao supermercado e ver um pacote de biscoitos por R$ 0,50. Você pensa: “Que pechincha!” Mas, ao abrir o pacote, descobre que ele está quase vazio. O que parecia uma ótima compra era, na verdade, só uma embalagem atrativa, mas com pouco conteúdo. No mercado de ações, a lógica é parecida. Muitos investidores, ao verem o preço baixo de uma ação, acreditam estar diante de uma grande oportunidade. Mas será que o pacote está tão cheio quanto parece?
Muitos se perdem nessa confusão entre preço e valor. É comum acreditar que o preço baixo de uma ação, por si só, indica que ela é barata, ou seja, uma boa oportunidade de compra. Essa confusão vem de de algumas fontes. Costumamos ancorar o preço de tudo para relativizar. A média e a mediana dos preços das 80 ações que formam o Ibovespa é de cerca de R$ 20. Assim, quando observamos uma ação com preço de R$ 2,00 ou menos, intuitivamente, tendemos a achar que o preço está errado, ou seja, seria uma oportunidade.
No entanto, isso é um erro que pode custar caro. O preço de uma ação é apenas uma parte da equação. O valor de uma empresa é algo muito mais profundo, pois envolve seus resultados, projeções futuras e o que ela representa para seus acionistas e credores.
A indústria de investimentos, em muitos casos, contribui para essa confusão. Quantas vezes você não se deparou com anúncios dizendo algo como: “Descubra 5 ações que você compra por menos de R$ 1,00!”? É o tipo de slogan que seduz pela simplicidade, mas falha em explicar o essencial: o preço isolado não diz nada sobre a qualidade de um investimento.
Para entender melhor, precisamos começar pelo conceito de valor uma empresa. O valor de uma empresa é a soma do que ela vale para todos que possuem direitos sobre ela, ou seja, credores e acionistas. Isso inclui tanto as dívidas que a empresa tem a pagar quanto o valor total das ações que ela emitiu. Afinal, o fluxo de caixa dela servirá para pagar a ambos. A matemática para chegar ao valor por ação envolve 3 passos. Primeiro calculamos o valor da empresa resultante do valor presente de seu fluxo de caixa. Esse seria o valor da empresa. Em seguida, subtraímos o valor da dívida líquida, pois os credores têm prioridade de recebimento. O que sobra é o valor das ações. Para se chegar ao valor por ação, dividimos o valor total das ações pela quantidade de ações e esse é o terceiro passo.
Vamos imaginar uma empresa fictícia. Suponha que o valor presente do fluxo de caixa dessa empresa tenha resultado em um valor total de R$ 2 bilhões. Assuma que ela tem uma dívida líquida de R$ 900 milhões e que tenha 55 milhões de ações em circulação (caso 1). Subtraindo dos R$ 2 bi a dívida líquida, encontramos um valor total para as ações de R$ 1,1 bilhão. Dividindo este último pelo número total de ações, encontramos um valor por ação de R$ 20.
Agora, se a mesma empresa acima tivesse 1 bilhão de ações emitidas (caso 2), o valor de cada ação seria de R$ 1,1. Repare que o valor total da empresa não mudou, apenas o número de ações influenciou o valor por ação. Logo, um preço menor por ação não significa que a empresa esteja mais barata. Isso apenas reflete como seu valor está distribuído entre as ações.
Sua avaliação se a ação está barata ocorre se o preço negociado no mercado for menor que o valor encontrado pela avaliação fundamentalista acima. Por exemplo, se no primeiro caso, o preço da ação negociada no mercado fosse de R$ 15, ela estaria barata, pois há um potencial de valorização de mais de 30% para se valorizar até R$ 20. Entretanto, no segundo caso, se o preço da ação negociada no mercado fosse de R$ 1,2, ela estaria cara, pois o potencia seria de desvalorização de mais de 8%.
Ou seja, o preço é apenas um reflexo da quantidade de ações e não necessariamente indica se a empresa é uma boa compra ou não.
Uma ação está barata apenas se, após fazer todas essas contas, o valor de mercado da empresa for superior ao preço que está sendo negociado. Se o preço de mercado for menor do que o valor que a empresa efetivamente vale, então podemos dizer que ela está “barata”. Caso contrário, o fato de o preço ser baixo não transforma automaticamente essa ação em uma oportunidade de compra.
Resumindo, a ideia de que um preço pequeno é sinônimo de oportunidade é um erro. Assim como aquele pacote de biscoitos aparentemente barato pode ser uma armadilha, uma ação com preço baixo pode estar longe de ser um bom investimento. O preço pode até ser leve, mas o peso da decepção pode ser grande se não considerarmos o valor real por trás da empresa.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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