Desde o início do governo, Fernando Haddad tem um problema maior. Em algum momento, quase todas as despesas públicas maiores não caberão no limite do arcabouço fiscal. O ministro da Fazenda sabia disso mesmo antes de apresentar seu projeto de contenção de despesas, déficit e dívida, entre março e abril de 2023.
O problema continua. Desde abril, há suspeita de que a situação virá a se agravar —houve mudança de meta fiscal para 2025; Congresso e elites passaram a rejeitar impostos, com estrépito etc. Como se não bastasse, o ambiente econômico mundial está encrencado —mais sobre o assunto mais adiante.
Em entrevista a Mônica Bergamo, nesta Folha, Haddad disse que tem tido mais tempo de falar com Luiz Inácio Lula da Silva sobre o assunto: “…a soma do salário mínimo [seu efeito do reajuste na Previdência], saúde, educação, BPC é maior do que o todo”, com o que o teto do aumento de despesas “não vai ser “respeitado”, ainda que a receita cresça.
É.
Assim, os juros sobem e o real se desvaloriza, ainda que a “Faria Lima” cometa “algum exagero”, diz Haddad.
Então, seria preciso rever aumentos reais do mínimo ou seu impacto sobre a Previdência, limitar o aumento de gastos com saúde, educação e de outras despesas ora sem controle. Ou fazer milagre a fim de compensar tais aumentos de gastos.
A decisão de desatar o rolo depende de Lula, é óbvio (se o Congresso não atrapalhar). Haddad foi muito explícito, em público —o ministro diz tais coisas para a finança e empresários. Por quê? Está certo de que Lula vai tomar providências? Se não tomar, o que o ministro vai fazer? A ministra do Planejamento, Simone Tebet, reafirmou nesta terça-feira (15) que Lula veta mexida na vinculação do piso da Previdência ao mínimo.
A situação se agrava. No atacadão do mercado de dinheiro e de empréstimos para o governo, as taxas de juros de prazo maior do que um ano não estavam tão altas desde fevereiro de 2023. A taxa real de juros de um ano passou de 8%, por onde não andava desde dezembro de 2022. A taxa implícita de juros da dívida pública não é tão alta, em um trimestre, desde 2018.
Desde junho, o dólar flutua entre a casa dos R$ 5,5 e a dos R$ 5,6, com respiros curtos em R$ 5,4. É problema potencial para a inflação e, assim, outro canal de pressão altista sobre juros. A pressão não vem apenas da desconfiança sobre as contas públicas.
Há problemas com a China, por exemplo, que batem também no dólar. O país cresce menos e tem havido frustrações com os pacotes de estímulos de reaquecimento da economia. Uma China mais devagar ajuda, por exemplo, a derrubar preços de commodities (como petróleo e minérios) —e a economia do mundo rico esfria um tanto também. A sobra de petróleo no mercado mundial (em parte por causa da China) segura o preço do barril.
Commodities com preço bom, do petróleo ao agro, contribuem para o aumento da renda nacional e da receita do governo.
Há sinais incipientes de superaquecimento da economia brasileira. Isso e a falta de perspectiva de controle da dívida pública jogam expectativas de inflação para cima (note-se a expectativa embutida nas taxas nominais de juros, o preço que de fato os donos do dinheiro cobram).Como os males de artérias entupidas, hipertensão e diabetes, os efeitos daninhos da dívida sem controle não aparecem de hora para outra. Mas aparecem.
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