Disclaimer: aviso legal, ressalva, termo de responsabilidade. Pode ser usado como introdução. Nas produções audiovisuais alerta para cenas de sexo, uso de drogas, violência, por exemplo. Dito isso, deixo aqui um “disclaimer” sobre o texto, que entrega o mistério que alimenta o enredo da série “Disclaimer”, disponível na AppleTV+.
Há alguns anos passamos a ver este tipo de aviso no começo de filme e séries. Aos poucos têm aparecido no começo de reportagens. A intenção de prevenir a audiência mais sensível pode até ser boa, mas serve mesmo para evitar dores de cabeça para produtores que não querem se responsabilizar juridicamente por reações negativas. Entendo que cenas violentas podem acionar possíveis “gatilhos psicológicos” e reavivar traumas do passado, mas esse excesso de zelo parece apenas mais um sinal de como adultos de hoje são muito mais infantis e despreparados para a vida, que não vem com disclaimer nenhum.
A série “Disclaimer” leva este nome porque a personagem principal, Catherine, interpretada por Cate Blanchett e por Leila George D’Onofrio, na versão jovem, recebe um livro e descobre que é o personagem principal da obra que tem, adivinhe, um disclaimer. No começo de todos os episódios, há o alerta para diversos tipos de “gatilhos”, incluindo violência sexual. E aí está o problema. Assim que entende o enredo da trama, o espectador mais atento percebe que nada parece o que é. A mulher que, aparentemente traiu o companheiro e causou a ruína de outra família, é a verdadeira vítima. Mas essa confirmação só vem no último episódio, depois que ela foi julgada pelo filho, pelo marido, pelos colegas de trabalho e pelo público, horrorizados com sua frieza e seu egoísmo.
“Disclaimer” traz ótimas reflexões. As mães de meninos enxergam seus filhos como virtuosos e ingênuos. A cena em que a jovem Catherine seduz Jonathan (Louis Partridge), descrita no livro misterioso pela mãe dele, a autora, é mais uma pista de que a história narrada não é a real. O jovem de 19 anos parece um garoto de 10 diante da sedução de uma mulher devoradora de homens, como Catherine é pintada. O comportamento do moço é tão caricato que acende um alerta. No final, entendemos que é assim que a mãe o imagina: puro, inocente, inofensivo, quando, na verdade, é um estuprador.
Catherine foi estuprada e guardou o segredo durante 20 anos, porque queria esquecer. Quando o passado volta a assombrar, ela é descrita como a mulher que traiu o marido num quarto de hotel na Itália, enquanto seu filho dormia. A reação de seu companheiro é colocá-la para fora de casa, atormentado pelo pensamento de que ela possa ter tido prazer, que tenha se deixado levar por um caso, ferido em seu orgulho, sua virilidade, em seu controle. A reação é de raiva e desprezo. Sentimentos que desaparecem quando a violência é revelada e dão lugar a arrependimento, empatia e, eu diria, perdão.
Homens até perdoam mulheres que são estupradas. Digo “até” porque há casos em que eles vão embora porque não conseguem lidar com a própria dor ao saber que sua propriedade foi violada. Mas traição… aí já é demais.
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